74ª CIPM/Juazeiro afirma que jovem quilombola, morto durante ação policial no Salitre, atirou contra a viatura; testemunhas rebatem a versão: “Ele não tinha arma”

Em nota enviada ao Portal Preto no Branco nesta segunda-feira (28), a Polícia Militar da Bahia se manifestou sobre a morte do jovem José William dos Santos Barros, 27 anos, morto neste domingo (27) durante uma ação policial na comunidade quilombola de Alagadiço, distrito do Salitre, em Juazeiro, no Norte da Bahia.

A 74ª CIPM alega que o jovem foi atingido por disparos de arma de fogo durante um confronto, e que foi encontrado um revólver calibre 38 com seis munições em posse da vítima.

Veja nota na íntegra:

“Policiais militares da 74ª CIPM apreenderam um revólver no final da tarde de domingo (27) em Juazeiro. De acordo com informações da unidade, os militares receberam a informação de que uma pessoa havia sofrido uma tentativa de roubo por um homem armado na estrada que liga as localidades conhecidas como Lagoa do Salitre e Rodeadouro. Após buscas na região, os militares encontraram um suspeito com características compatíveis com as informadas pela vítima. Quando da aproximação da PM, o homem sacou um revólver e atirou contra a guarnição, que revidou. O suspeito foi atingido e socorrido para uma unidade hospitalar, mas não resistiu. Um revólver calibre 38 e seis munições (três deflagradas e três intactas) foram apresentados na delegacia que atende à região”.

O que diz a comunidade

Porém, em entrevista ao PNB, uma testemunha que estava com José Willian durante a ação, contesta a versão da PM. De acordo com ela, que preferiu não ser identificada, a vítima estava desarmada e foi atingida pelas costas enquanto pilotava uma motocicleta.

“Nós estávamos na pista fazendo o que a gente mais gostava, que era empinar moto. Era o nosso lazer e a gente praticava sempre respeitando a passagens dos carros. Ontem as viaturas passaram por nós e quando voltaram, mandaram Willian parar a moto e já foram atirando. William estava pilotando a moto, em momento algum ele disparou contra as viaturas. Ele não tinha arma, nem drogas. Era um trabalhador querido na comuniddae”, contou.

A testemunha disse ainda que os policiais demoraram a prestar socorro ao jovem, que segundo ela, foi levado ao hospital já sem vida.

“Eles se preocuparam em recolher as capsulas das balas que ficaram no local. Quando vieram pegar Willian, ele já estavam morto. Só pegaram o corpo dele e jogaram na viatura de qualquer jeito. Nem sequer informaram para onde estavam levando ele. Somente após 1 hora de relógio foi que a família encontrou ele no Hospital Regional”, acrescentou.

A testemunha finalizou ressaltando que Willian era um jovem trabalhador, com um filho pequeno para criar.

“Ele era um rapaz bom, que sempre trabalhou e nunca se envolveu com coisas erradas. A gente gostava de empinar moto, mas isso não é crime. Ele tem um filho pequeno que acabou de completar 4 anos, que agora vai ficar sem o pai. Nós só queremos justiça”, cobrou.

Wiliam trabalhava no aterro sanitário de Juazeiro. O velório dele acontece na tarde de hoje.

Em nota, a Comunidade Quilombola de Alagadiço criticou e repudiou a ação policial pelo “uso excessivo de força, preconceito racial e discriminação por parte das autoridades que deveriam proteger todos os cidadãos.”

Entidades ligadas ao movimento negro emitiram uma nota de “Dor, Luto e Revolta pela morte de mais um jovem negro quilombola”

Confira

O jovem José Wiiliam Santos Barros, de 26 anos, foi assassinado ontem (27/08/23) na Comunidade Quilombola do Alagadiço, pela Polícia Militar. Esta é a primeira comunidade a ser certificada na cidade de Juazeiro, Bahia. Os moradores relatam que ele estava em pé em uma moto, na estrada em frente ao Alagadiço, junto com várias outras pessoas da comunidade, quando foi alvejado nas costas pela Polícia Militar, morrendo na hora. Não houve qualquer possibilidade de diálogo, defesa ou anúncio de prisão. Ainda segundo os moradores, o corpo sumiu por uma hora, sem que fosse dada nenhuma satisfação para os moradores, que o encontraram no Hospital Regional da Cidade. O sepultamento será às 16:30, na comunidade.

Esse assassinato acontece no mesmo mês em que foi brutalmente executada, com 12 tiros, a líder quilombola Bernadete Pacífico. A dor, o luto e a revolta tomam conta da população negra de todo país!

A população negra da Bahia tem enfrentado dias difíceis, em que a morte ronda as periferias, nossos jovens, nossas lideranças com muito mais contundência. O Estado registrando o índice macabro de campeã de mortes por ações policiais, chegando a quase 1500, em 2022, superando o Rio de Janeiro, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Nos últimos 7 anos o número dessas ocorrências cresceu mais do que quatro vezes.

Exigimos a mudança da política de Segurança Pública no Estado!!! Nossos corpos não podem mais ser sempre o alvo. Ao ouvir críticas à ação da Polícia Militar, o Governador Jerônimo declarou, em um programa da tv aberta, todo apoio à forma de atuação das polícias locais. Não pode ser assim, governador!!! Essa herança de Rui Costa tem que ser rompida! Essa será a principal política pública para as populações negras da Bahia?

Compir – Conselho de Promoção da Igualdade Racial de Juazeiro (BA)
Articulação Quilombola
Frente Negra do Velho Chico
Pérola Negra
Coletivo Enxame

Nota de Repúdio: Ação da Polícia Militar em relação ao Jovem William da Comunidade Quilombola de Alagadiço, Juazeiro-BA

Nós, membros da Comunidade Quilombola de Alagadiço em Juazeiro, Bahia, manifestamos nosso profundo repúdio em relação à ação da Polícia Militar que resultou na trágica morte do jovem William, um integrante desta comunidade.

É com indignação e tristeza que observamos as circunstâncias em torno dessa fatalidade. A Polícia Militar alegou que o jovem estava empinando uma moto, porém, o testemunho de membros da nossa comunidade contradiz essa versão. Segundo relatos de testemunhas, William estava simplesmente em pé na motocicleta quando foi alvejado fatalmente pela polícia.

Este incidente trágico destaca um problema maior e sistêmico que enfrentamos. Vemos essa ação como um exemplo gritante de uso excessivo de força, preconceito racial e discriminação por parte das autoridades que deveriam proteger todos os cidadãos. A perda de William é uma lembrança dolorosa das vidas negras que continuam sendo afetadas pela violência e pelo racismo institucional.

É profundamente preocupante e lamentável que a população negra continue a enfrentar brutalidade por parte da polícia militar no estado da Bahia e em muitas outras regiões. A persistência desse problema destaca a necessidade urgente de abordar questões de discriminação racial, violência policial e desigualdade em todo o sistema de justiça e segurança pública.

Estamos unidos em nossa dor e determinação por mudança. Continuaremos a lutar contra o racismo estrutural e por um sistema de justiça que realmente proteja e sirva a todos os cidadãos, especialmente da população quilombola.

Comunidade Quilombola de Alagadiço
Juazeiro, Bahia

#vidasnegrasimportam

Redação PNB

Post Author: Rogenilson Reis

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